Epistemologia

Vamos explicar o que é a epistemologia, o que estuda e suas funções. Além disso, quais são as suas características, tipos e exemplos.

Platón - teología
A epistemologia procura responder à pergunta sobre o que é possível chegar a conhecer.

O que é a epistemologia?

A epistemologia é o ramo da filosofia interessado em estudar como o conhecimento é obtido e qual é a sua validade. Seu nome vem dos vocábulos gregos epistḗmē (“conhecimento”) e logos (“estudo”, “ciência” ou “palavra”), e por isso é chamada, de maneira geral, ciência do conhecimento.

A epistemologia aborda problemas de diversas índoles sobre o modo em que compreendemos, adquirimos e validamos o conhecimento. Sempre procura responder à pergunta sobre o que é possível chegar a conhecer e através de quais meios ou mecanismos.

Nessa busca, a epistemologia pode atravessar ou combinar seu campo de estudo com o de muitas outras disciplinas. Além disso, pode servir de base para que elas possam pensar em si mesmas. Também, e por estas mesmas razões, frequentemente é confundida com a gnosiologia, que estuda o conhecimento em geral. Parte da comunidade acadêmica atual defende que o campo de estudo específico da epistemologia é o conhecimento científico per se.

Problemas gerais da epistemologia

Epistemología
A epistemologia estuda a forma como obtemos conhecimento.

Como disciplina filosófica, a epistemologia enfrenta seus problemas através de diversas perguntas que se direcionam não para o que é o conhecimento, mas como o conseguimos.

Assim, algumas de suas principais preocupações giram em torno de quais são as fontes do conhecimento, como ele ocorre, como distinguir um conhecimento verdadeiro de um falso e que tipo de conhecimento podemos obter. Este tipo de perguntas se aproximam do que se conhece como “teoria do conhecimento”.

Praticamente todos os grandes filósofos da história contribuíram com a epistemologia de um modo ou de outro, propondo conceitos e diversos mecanismos de validação do saber. Ao longo dos últimos anos, a epistemologia foi trabalhada com maior acuidade por filósofos e cientistas anglo-saxões, que direcionaram a disciplina para o campo da filosofia da ciência.

Entretanto, como disciplina autônoma, é importante deixar claro que a tarefa principal da epistemologia é o estudo crítico, histórico e contextual das ciências, bem como seus princípios, métodos e resultados. Desta maneira, também, entende-se por ciência toda aquela disciplina que pretenda produzir ou obter conhecimento em geral.

Etimologia

O termo “epistemologia” é o resultado da união do vocábulo grego epistḗmē (ἐπιστήμη), que significa “conhecimento” ou “ciência”, com o sufixo –logia, que vem da palavra logos (λόγος) e pode ser traduzido como “estudo”, “razão” ou “discurso lógico”. Partindo da sua origem etimológica a epistemologia é a “teoria da ciência” (não deve ser confundida com a teoria do conhecimento, que é uma área própria do discurso científico).

Na Grécia, a palavra episteme referia-se ao conhecimento intelectual, diferente do conhecimento da tekhné (técnica), que era o conhecimento instrumental, e diferente da doxa (ou conhecimento geral), associada à opinião comum das pessoas não formadas nos diferentes domínios do saber.

História da epistemologia

Mesmo quando se fala da epistemologia como ciência ou ramo científico com autonomia própria, sua história pode remontar aos trabalhos dos filósofos gregos, como Platão e Aristóteles.

Naquela época, distinguia-se entre dois tipos de conhecimento: a doxa ou conhecimento vulgar, e a episteme, que era o conhecimento reflexivo fruto do pensamento. Não obstante, não existia uma disciplina equivalente à epistemologia moderna.

Este ramo da filosofia deu os seus primeiros passos formais no Renascimento europeu (séculos XV e XVI). Isto deveu-se ao giro científico da época, que passou da fé à razão como método de obtenção da verdade e do conhecimento em geral.

Seu impulso se deve em grande parte às obras de filósofos e cientistas como Johannes Kepler (1571-1631), Galileu Galilei (1564-1642), Francis Bacon (1561-1626), René Descartes (1596-1650), Isaac Newton (1642-1727), John Locke (1632-1704), Immanuel Kant (1724-1804) e Gottfried Leibniz (1646-1717).

Os trabalhos de Locke, por exemplo, pormenorizaram métodos de obtenção do conhecimento, como também fizeram Descartes ou Kant, em suas respectivas obras e segundo seus pontos de vista particulares.

Entretanto, quem mais influenciou no meio científico para a formação da epistemologia foram os pensadores neopositivistas lógicos, participantes do que se conhece como o Círculo de Viena. Entre eles estavam, por exemplo, Carnap, Neurath e Hempel, motivados pelas obras de Bertrand Russell, por um lado, e Ludwig Wittgenstein, por outro.

Karl Popper foi quem discutiu os elementos introduzidos pelo Círculo de Viena. Criticou e substituiu o conceito de indução (que é o processo pelo qual se chega de um enunciado particular a um geral) pelo método lógico-dedutivo. Este afirma que as teorias não são verificáveis mas corroboradas momentaneamente. De qualquer modo, são mantidas até que sejam derrubadas por outras teorias que acabam por substituí-las, como aconteceu com a indução em geral.

A epistemologia foi fundamental na formulação do conceito da ciência e do conhecimento científico, que imperou no pensamento dos séculos XIX e XX. Durante este último século, desenvolveu-se a hermenêutica como teoria filosófica. Hans-Georg Gadamer (1900-2002) defendia que a tarefa do filósofo era a de interpretar os textos já escritos, buscando seu sentido e a forma em que articulavam as diferentes ideias para gerar conhecimento. Graças ao trabalho de Gadamer, a epistemologia abriu caminho para outras áreas do conhecimento, como a história, a política, a economia e até mesmo a arte. Todas elas são campos férteis de pensamento cujas pesquisas permanecem vigentes.

Escolas da epistemologia

Karl Popper - epistemología
O racionalismo crítico é fruto do trabalho de Karl Popper.

A partir do século XX, três escolas diferentes de epistemologia contemporânea vigentes ainda hoje foram fundamentadas:

  • O neopositivismo lógico. Fruto dos estudos de Bertrand Russel (1872-1970) e Ludwig Wittgenstein (1889-1951), formou-se em torno do Círculo de Viena, que transformou o positivismo herdado século XIX em uma doutrina que mais tarde encontrou eco no Círculo de Berlim e no Círculo de Praga.
  • O racionalismo crítico. Fruto da obra de Karl Popper (1902-1994), manifestou-se criticamente contra o neopositivismo lógico e deu uma reviravolta determinante aos fundamentos do Círculo de Viena.
  • O pospopperianismo. Nesta categoria entram os filósofos que, embora se inspirem no positivismo ou na obra de Popper, não se inscrevem nela completamente.

Embora tenha a sua origem na epistemologia, a hermenêutica não é considerada uma ciência epistemológica contemporânea, mas uma derivação dela.

O  objeto de estudo da epistemologia

A epistemologia centra-se na natureza, origem e limites do conhecimento humano.

Esta disciplina determina então os tipos de conhecimento possíveis, os mecanismos graças aos quais podemos formá-los, e a lógica que nos permite determinar se um conhecimento é válido ou não.

Neste sentido, seus conceitos mais gerais são a verdade, a objetividade, a realidade e a justificação. No entanto, não busca apenas isso. Em linhas gerais, podemos dizer que a epistemologia estuda:

  • O contexto histórico, social e objetivo do surgimento do conhecimento científico.
  • Os critérios usados para afirmar se um saber pertence ao campo do conhecimento científico.
  • Os conceitos de verdade, justificação, corroboração e hipótese, entre outros.

Problemas da epistemologia

A epistemologia aborda problemas gerais do saber e específicos do campo de diferentes ciências ou disciplinas. Podem ser resumidos da seguinte maneira, partindo do mais geral para o mais específico:

  • Problemas sobre as relações entre os diversos campos do conhecimento científico, como se classificam as ciências, que pontos de contacto têm, etc.
  • Problemas relativos às ciências formais e às ciências concretas.
  • Problemas sobre o empréstimo conceitual entre as ciências e como a mudança de perspectiva entre elas modifica também o sentido dado a certas ideias “comuns”.
  • Problemas vinculados com os aspectos teóricos e experimentais das ciências, ou seja, em torno da comprovação, da objetividade, da verdade científica e da formulação de leis, teorias e hipóteses.
  • Problemas inerentes ao pensamento formal: lógico e matemático, aos limites entre eles e à sua ontologia.
  • Problemas inerentes às ciências da realidade: tudo que esteja relacionado com a comprovação experimental, com a metodologia científica e os processos indutivos.
  • Problemas inerentes às ciências da vida e do ser humano, nas quais surge a necessidade de distinguir entre fatos e realidades, valorizações e interpretações.

Funções da epistemologia

Algumas das funções desta disciplina no estudo e pesquisa têm a ver com:

  • Questionar os limites do conhecimento. Pode rever e questionar os métodos aceitos de formulação do conhecimento a partir do mundo real.
  • Examinar as metodologias. Encarrega-se de questionar os métodos usados para distinguir um conhecimento válido de uma crença ou suposição, ou para distinguir o conhecimento de onde se origina.

Diferenças com a gnosiologia

epistemología
Muitos estudiosos aceitam a epistemologia como sinônimo de gnosiologia.

A gnosiologia é um ramo da filosofia que estuda a forma como constituímos o conhecimento do mundo. A diferença fundamental com a epistemologia reside no fato de que a gnosiologia se encarrega do estudo do alcance de todo tipo de conhecimento em geral, enquanto que a epistemologia se limita ao conhecimento científico.

Entretanto, esta distinção é frequentemente questionada. Alguns acadêmicos da área anglo-saxônica argumentam que epistemologia pode ser sinônimo de gnosiologia. Também a usam como sinônimo de uma categoria ainda mais ampla, que é a teoria do conhecimento.

Alguns representantes da epistemologia

Desde que a epistemologia é considerada uma disciplina autônoma e independente, surgiram trabalhos de diferentes pensadores e filósofos sobre esta questão. Alguns deles são os seguintes:

  • Rudolf Carnap, Otto Neurath e Carl Hempel. Fizeram parte do Círculo de Viena e emigraram para os Estados Unidos para dar continuidade ao seu trabalho.
  • Karl Popper. Crítico fervoroso em relação ao neopositivismo lógico, o uso do método lógico-dedutivo é atribuído a ele.
  • Hans-Georg Gadamer. Fundador da hermenêutica, utilizou a epistemologia para trabalhar diferentes ciências humanas, geralmente afastadas do discurso científico tradicional.
  • Paul Ricoeur. Fenomenólogo e hermenêutico francês, estabeleceu um diálogo entre o método científico-hermenêutico e o campo de estudo da fenomenologia (área que estuda o aparecimento dos fenômenos).

Alguns exemplos de epistemologia

Uma forma de aplicar critérios epistemológicos é através do uso da crença, verdade e justificação. A finalidade de aplicar estes três aspectos é garantir de forma satisfatória que uma crença pode ser considerada conhecimento.

  • Crença. Alguém não pode dizer que sabe algo se não acredita que isso é verdade.
  • Verdade. Alguém que acredita em algo falso, não sabe como um fato, e sim que é errôneo.
  • Justificação. Alguém deve ter uma justificação plausível para que aquilo em que acredita seja considerado conhecimento verdadeiro.

Por exemplo: João sabe que existem vacas na fazenda do vizinho. Podemos considerar que isto é algo que João sabe.

  1. João acredita ser verdade (crença).
  2. Existem vacas na fazenda do vizinho. (verdade).
  3. João viu as vacas na fazenda do vizinho. (Justificação).

Referências

  • Grondin, J. (1999). Introducción a la hermenéutica filosófica. Herder.
  • Ayer, A. J. (Ed.). (1965). El positivismo lógico. FCE.
  • Bachelard, G. (1975). Epistemología. Anagrama.
  • Waetofsky, M. W. (1973). Introducción a la filosofía de la ciencia, 2 vols. Alianza.
  • Verneaux, R. (1999). Epistemología general o crítica del conocimiento. Herder.
  • “Epistemology” em Internet Encyclopedia of Philosophy (IEP).
  • “Epistemology” em The Encyclopaedia Britannica.

Como citar?

Citar a fonte original da qual extraímos as informações serve para dar crédito aos respectivos autores e evitar cometer plágio. Além disso, permite que os leitores acessem as fontes originais que foram utilizadas em um texto para verificar ou ampliar as informações, caso necessitem.

Para citar de forma adequada, recomendamos o uso das normas ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), que é uma entidade privada, sem fins lucrativos, usada pelas principais instituições acadêmicas e de pesquisa no Brasil para padronizar as produções técnicas.

Espínola, Juan Pablo. Epistemologia. Enciclopédia Humanidades, 2023. Disponível em: https://humanidades.com/br/epistemologia/. Acesso em: 5 de novembro de 2024.

Sobre o autor

Autor: Juan Pablo Espínola

Licenciatura em Filosofia (Universidad de Buenos Aires)

Traduzido por: Márcia Killmann

Licenciatura em letras (UNISINOS), Doutorado em Letras (Universidad Nacional del Sur)

Data da última edição: 28 de maio de 2024
Data de publicação: 29 de junho de 2023

Esta informação foi útil para você?

Não

    Genial! Obrigado por nos visitar :)